Querido Diário:
Primeira aula de Historia da Literatura: o professor Xosé Salgado é um prato. O contraste com o estilo do Mariño foi imediato. Usa muitos castelanismos e tem uma muleta que se tornou já uma espécie de grito de guerra para nós: BUENO. Escrevo em caps lock porque ele fala bastante alto e esta muleta mais alto do que o resto do discurso.
Fez uma selecção de textos para nós e começou por um da Rosalía. A Xustiza pola man. Já o tinha lido na aula de galego em Braga, mas a interpretação dele foi muito diferente daquela que fizemos. Aliás, não muito diferente: mas aquilo que é possível logo entender das primeiras estrofes, o Salgado achou que podia ser interpretado de outras formas.
Isto depois de se declarar logo no início da aula "não rosaliano". Na verdade, com o tempo fomos percebendo que os seus ligeiros laivos machistas não podiam, de facto, ser conciliados com a coragem feminista dela.
Mesmo assim, a aula foi boa, e valeu-nos boas risadas ao imitiarmos o BUENO e ainda o DALLE, que usa para mandar alguém ler.
Ao meio dia tivemos nova conferência, desta vez sobre cantigas medievais. Confesso que não gostei nada. Passo a explicar: não que o tema não me interesse, mas porque a Paulina, polaca que se dedica inteiramente ao estudo e recriação das cantigas medievais galaico-portuguesas, começou a sessão logo por cantar uma. Naquele tom de igreja estranha. Foi muito surreal!!!
Queria rir mas ao mesmo tempo sair dali a correr. Infelizmente, não foi a única vez que cantou, excepto quando nos mostrou uma música que tinha quer ser cantada a três vozes, e felizmente usou o computador para nos mostrar. Dessa gostei mais. Dentro do estilo eclesiástico, claro.
Depois voltou aos seus cânticos e obrigou-nos a decorar e cantar com ela o refrão de uma cantiga de escárnio e maldizer. O raio da melodia e parte da letra ainda me assaltam às vezes a cabeça e quero chorar. Não consigo explicar a sensação.
Para contextualizar: esta rapariga estudou na Sorbonne em Paris as cantigas medievais. Depois veio fazer o mesmo curso que nós para aprender galego e poder aprender a cantar as cantigas. Entretanto ficou a trabalhar aqui em Compostela e agora é responsável por reavivar e registar as cantigas de Santa María. Gabo-lhe o currículo, sem problema, mas na verdade não consigo perceber bem uma paixão assolapada destas por uma coisa destas.
Contaram-me que, quando foi aluna do galego sem fronteiras, na sessão de claurusa, cantou no final. Sozinha. Sem ninguém lhe pedir e sem avisar. AWKWARD. Consigo imaginar a cara de toda a gente, especialmente daqueles que não puderem deixar de sorrir cordialmente e fingir que era uma coisa normal. Soube também que às vezes andava pela cidade a cantar aquilo. A sério, convivo muito bem com vários tipos de patologias, mas esta ultrapassou-me. Não aguento.
A rapariga era simpática e tudo, mas espero nunca mais ter que a ouvir cantar aquela merda.
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